A Companhia das Letras, uma das melhores editoras brasileiras, inaugurou esta semana o seu blogue. E começa bem, muito bem, com textos sobre Roberto Bolaño de dois dos seus melhores amigos, Alan Pauls e Rodrigo Fresån. Pretexto: o lançamento em breve, no Brasil, de 2666.
«Roberto Bolaño disse certa vez: âHĂĄ livros que inspiram medo. Medo de verdade. Mais que livros, parecem bombas-relĂłgio ou animais falsamente empalhados dispostos a pular no seu pescoço se vocĂȘ se descuidarâ. A categoria â livros temĂveis â parece pensada Ă medida de 2666. Como todas as grandes ficçÔes de Bolaño â penso em Estrela distante, por exemplo â, 2666 dĂĄ medo. DĂĄ medo e faz rir ao mesmo tempo. LĂȘ-lo Ă© entrar num tremor, numa convulsĂŁo fĂsica. NĂŁo Ă© um livro que se dirige ao leitor; nĂŁo pretende falar com ele nem enfeitiçå-lo. Ele quer tocĂĄ-lo, marcĂĄ-lo, atravessĂĄ-lo com o vento gelado da morte e a brisa ardente da gargalhada.»
Alan Pauls
«A obra de Roberto Bolaño â chame-se o Santo Gral de CesĂĄrea Tinajero em Os detetives selvagens, ou de Benno von Archimboldi em 2666, ou de Wieder/Ruiz-Tagle em Estrela distante â estĂĄ sempre marcada pela busca de âseres-livrosâ. Pessoas que nĂŁo podem parar de escrever e de ler.
E me ocorre que a leitura ou a releitura de 2666 Ă© consequĂȘncia da escrita de 2666. Explico-me: a escrita noturna e lançada ao abismo de 2666 â Bolaño apostando uma corrida contra tudo, noite apĂłs noite, para alcançar a Ășltima pĂĄgina de seu romance antes do Ășltimo amanhecer de sua vida â age sobre o leitor causando um efeito similar. NĂŁo importa a hora que seja; quando se lĂȘ ou relĂȘ 2666 a gente nĂŁo demora a se entregar a uma espĂ©cie de transe entre sonĂąmbulo e insone. Em 2666, a prosa de Bolaño cativa mais do que em qualquer de seus outros livros porque aqui se trata de conseguir uma espĂ©cie de summa artĂstica, plenamente harmĂŽnica e ao mesmo tempo disfuncional onde â por meio de epifanias de longa distĂąncia suspensas no espaço ou abruptas aceleraçÔes no tempo emolduradas no formato de romance aberto, de romance exterior e interior ao mesmo tempo â, o que se persegue e se alcança nĂŁo Ă© outra coisa senĂŁo uma teoria do mundo, de todo o mundo.»
Rodrigo FresĂĄn
Os textos completos podem ser lidos aqui.